A carta, cujo não menciona a fraude, serve como momento marcante na psiquiatria americana.
No dia 9 de setembro, a Mad in America publicou uma longa reportagem sobre o escândalo da STAR*D, descrevendo como Ed Pigott e seus colegas, em uma série de publicações que datam de 2010, mostraram que autores da STAR*D violaram o protocolo de várias maneiras para gravemente inflar a taxa de remissão que foi anunciada naquele estudo.
Neste agosto, Pigott e seus colegas deram o golpe final. Tendo obtido dados sobre pacientes por meio da iniciativa Restoring Invisible and Abandoned Trials (RIAT), eles relataram pelo BMJ Open que, se o protocolo do estudo tivesse sido seguido, a “taxa de remissão cumulativa” no estudo, ao final de quatro etapas de tratamento, teria sido de 35%, e não dos 67% que os pesquisadores do STAR*D anunciaram em seu artigo de novembro de 2006.
Enquanto Pigott e seus colegas analisavam cuidadosamente o estudo da STAR*D durante esse período de 13 anos, os autores da STAR*D nunca defenderam publicamente o seu trabalho. Quando publicaram a sua reanálise do RIAT, os editores do BMJ Open pediram uma resposta dos autores da STAR*D, mas “eles se recusaram” a fazê-lo, informou a revista.
Em conjunto com o nosso relatório de 9 de setembro, criamos uma petição no site change.org suplicando que o American Journal of Psychiatry retratasse o artigo de novembro de 2006. A inflada taxa de remissão de 67% foi divulgada ao público por quase duas décadas, regularmente mencionada na mídia sempre que a eficácia dos antidepressivos era questionada, e agora que a má conduta científica e a fraude de pesquisa dos pesquisadores da STAR*D tem sido tão claramente estabelecida, nossa petição argumenta que os editores do periódico estão obrigados, de acordo com os padrões de ética científica, a retratar o estudo.
No dia 10 de outubro, escrevi ao editor-chefe do American Journal of Psychiatry, Ned Kalin, notificando-o sobre nossa petição, que havia sido assinada por mais de 1.800 pessoas. Kalin não nos respondeu e, portanto, parecia que o silêncio – dos pesquisadores da STAR*D e do American Journal of Psychiatry – seria a resposta deles.
No entanto, no dia 1º de dezembro, o American Journal of Psychiatry publicou uma carta ao editor recebida de John Rush e quatro de seus colegas da STAR*D. Embora não haja menção à nossa petição, a carta serve claramente como uma resposta a ela. Eles intitularam a carta de “Os dados da STAR*D seguem fortes: resposta a Pigott et al.”.
Como o título indica, não há admissão de erros ou violações de protocolo. Trata-se de uma carta que busca defender a integridade de sua pesquisa.
Como escrevemos em nosso relatório MIA, havia tanto perigo quanto oportunidade para a profissão psiquiátrica, uma vez que a má conduta de pesquisa no estudo da STAR*D havia sido documentada de forma tão clara. A publicação da taxa de remissão fabricada de 67% desrespeitou a expectativa do público de que a disciplina médica seria uma relatora honesta de resultados da pesquisa, e foi fácil identificar como a promoção desse resultado falso causou danos ao público. Nós apresentamos o desafio à profissão da seguinte forma:
“O dano [causado] também se estende à reputação da psiquiatria perante o público. O escândalo da STAR*D, como ficou conhecido, alimenta a crítica pública à psiquiatria que a área tanto repudia.
No entanto, e isso pode parecer contraintuitivo, existe hoje uma oportunidade que a psiquiatria pode aproveitar. A Associação Americana de Psiquiatriaem conjunto com a comunidade internacional de psiquiatras poderia dar um grande passo para recuperar a confiança do público ao expor a fraude da STAR*D e solicitassem uma retratação dos artigos publicados. Isso seria uma ação que demonstraria o compromisso de uma profissão, à medida que avança, de respeitar padrões de pesquisa e de fornecer ao público uma avaliação honesta da “base de evidências” de medicamentos psiquiátricos.
Caso contrário, deixar de o fazer só servirá para aprofundar justificáveis críticas ao campo. Será uma continuação do que acontece nos últimos 15 anos, onde a psiquiatria tem demonstrado, através da sua falta de ação, que a má conduta em pesquisa nessa área da medicina – má conduta que se eleva ao nível de fraude científica – é uma prática aceitável, mesmo que possa causar sérios danos.”
A carta mandada ao editor por Rush e colegas deixa claro por qual desses dois caminhos a psiquiatria, como profissão e como editora do American Journal of Psychiatry