Resumo
Antecedentes: Este artigo analisa os eventos e as condições que levaram à criação da Plataforma Internacional de Registro de Ensaios Clínicos (IERCP- International Clinical Trials Registry Platform) em 2006 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e como a OMS abordou a questão da transparência na pesquisa farmacêutica global. Usando análise textual histórica, apresento os debates científicos que defenderam a criação de registros oficiais de ensaios clínicos em periódicos médicos além das repercussões do escândalo do Paxil da GSK em 2004, identificando os principais argumentos éticos e científicos que levaram ao envolvimento da OMS como ator importante no registro de ensaios no contexto do modelo de negócios das grandes empresas farmacêuticas.
Resultados: Tratando as perguntas “Por que registrar?” e “Por que registros?” como guia, examino as questões de viés de publicação e seletividade de relatórios pela Indústria, identificando duas maneiras pelas quais a prática de viés de publicação prejudicam a transparência em pesquisas patrocinadas pela Indústria. A primeira envolve preocupações éticas relacionadas à exploração de participantes humanos e à ocultação de resultados negativos. A segunda aborda a deterioração da confiabilidade de evidências devido ao acesso incompleto aos resultados de ensaios. Ao revisar a série de eventos ocorridos entre 2004 e 2006 – período entre o escândalo do Paxil e o lançamento do IERCP -, analiso as ações tomadas pelos diferentes atores envolvidos: (1) o Comitê Internacional de Editores de Periódicos Médicos (ICMJE) e a criação do Grupo de Ottawa; (2) a OMS, partindo da Cúpula Ministerial sobre Pesquisa em Saúde realizada em novembro de 2004, e (3) as respostas da Indústria farmacêutica e, nomeadamente, a da GSK ao pedido de transparência e registro de ensaios.
Conclusões: A história do registro de ensaios usando o IERCP como aparato de asseguração da veracidade de dados mostra a dificuldade em regulamentar um empreendimento de saúde transformado em um negócio global. Além disso, demonstra os desafios apresentados pela globalização e como é mais fácil e rápido globalizar negócios em comparação com a globalização de boas práticas, levantando a questão de que tem sido tão difícil desfazer certas tendências. De fato, a história do movimento a favor de um registro de ensaios não é uma história de sucesso em regulamentação, ou pelo menos ainda não.