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Conflitos de Interesse

Australia. As Empresas Farmacêuticas pagam os médicos mais de A$11 milhões por ano para viagem e educação. Aqui constamos quais especializações receberam mais

(Drug companies pay doctors over A$11 million a year for travel and education. Here’s which specialties received the most)
Barbara Mintzes, Malcolm Forbes
The Conversation, 23 de mayo de 2024
https://theconversation.com/drug-companies-pay-doctors-over-a-11-million-a-year-for-travel-and-education-heres-which-specialties-received-the-most-230303
Traduzido por Salud y Fármacos, publicado em Boletim Fármacos: Ética 2024; 2(4)

Tags: Medicines Australia, pagamentos de empresas farmacêuticas a médicos segundo sua especialização, pagamentos da indústria influem na prescrição, KOL, líderes de opinião, favorecer o lucro da indústria, táticas de publicidade da indústira

Empresas farmacêuticas têm pago milhões de dólares por ano a médicos australianos para que eles participem de conferências e reuniões no exterior, deem palestras a outros médicos e participem de conselhos consultivos, segundo nossas pesquisas.

Nossa equipe analisou relatórios das principais empresas farmacêuticas, numa primeira análise detalhada desse tipo [1]. Descobrimos que empresas farmacêuticas pagaram mais de A$33 milhões a médicos durante os três anos entre o final de 2019 e o final de 2022 por tais consultorias e despesas associadas.

Sabemos que esse valor é menor do que as empresas farmacêuticas gastaram com os médicos, pois não inclui o benefício mais básico – comida e bebida – o que não é declarado por empresas farmacêuticas na Austrália [2].

Devido às restrições como consequência da COVID, a período que analisamos inclui uma época em que médicos provavelmente estariam viajando menos e participando de menos conferências médicas presenciais. Sendo assim, suspeitamos que os níveis atuais de financiamento das empresas farmacêuticas sejam ainda mais alto, especialmente quando se trata de viagens.

O que fizemos e o que descobrimos
Desde 2019, a Medicines Australia, a associação comercial de empresas farmacêuticas de marca, divulga um banco de dados centralizado que contabiliza pagamentos feitos a profissionais de saúde [3]. Este relatório representa a primeira análise detalhada desse banco de dados.

Fizemos o download dos dados e comparamos os nomes de médicos com as fichas da Agência Australiana de Regulamentação de Profissionais de Saúde (Australian Health Practitioner Regulation Agency,Ahpra) [4]. Em seguida, analisamos quantos médicos especialidade médica receberam pagamentos da indústria por especialidade médica e quanto foi pago por empresas para cada especialidade.

Descobrimos que mais de dois terços de reumatologistas receberam pagamentos da indústria. Reumatologistas normalmente prescrevem novos medicamentos biológicos caros que funcionam para suprimir o sistema imunológico. Esses medicamentos são responsáveis por uma proporção substancial dos custos incluídos nos medicamentos do Esquema de Benefícios Farmacêuticos (Pharmaceutical Benefits Scheme, PBS) [14, 15].

Pagamentos de empresas farmacêuticas por especialidade

Os especialistas que receberam mais financiamento como um grupo foram médicos de câncer (especialistas em oncologia/hematologia). Eles receberam mais de $6 milhões em pagamentos.

Isto não nos surpreende, considerando que foram recentemente aprovados novos e caros medicamentos contra o câncer. Alguns desses medicamentos trazem avanços maravilhosos ao tratamento; outros oferecem melhora mínima em sobrevivência ou em qualidade de vida [6].

Um estudo de 2023 revelou que médicos que recebiam pagamentos da indústria tinham maior probabilidade de prescrever tratamentos contra o câncer de baixo valor clínico [7].

Nossa análise encontrou que alguns médicos receberam uma série de pequenos pagamentos de algumas centenas de dólares. Também houve instâncias de grandes pagamentos individuais.

Por que tudo isso é importante?
Médicos geralmente acreditam que a promoção feita por empresas farmacêuticas não os afeta [8]. No entanto, a pesquisa nos conta uma história diferente. Pagamentos vindo da indústria podem afetar tanto decisões relacionadas à prescrição pelos próprios médicos quanto as de seus colegas [9].

Um estudo realizado nos Estados Unidos analisando jantares oferecidos a médicos – que custam, em média, menos de $20 – constatou que quanto mais jantares um médico era oferecido, maior quantidade do medicamento promovido ele prescrevia. [10].

Outro estudo constatou que quanto mais jantares um médico era oferecido por fabricantes de opióides (uma classe de analgésicos fortes), maior quantidade de opióides ele prescrevia [11]. A prescrição excessiva teve papel fundamental na crise de opióides sofrida na América do Norte [12, 13].

Em geral, uma quantidade significativa de pesquisas demonstra que o financiamento pela indústria afeta a prescrição, inclusive de medicamentos que não são de primeira opção devido à sua baixa eficácia, segurança ou custo-benefício [14, 15].

Além disso, há médicos que atuam como “líderes de opinião” para empresas. Isso inclui consultores pagos que dão palestras para outros médicos. Um ex-funcionário da indústria que recrutava médicos para tais funções declarou [16]:

“Os principais líderes de opinião funcionam como vendedores para nós, nós constatamos sempre o retorno do nosso investimento, acompanhando a quantidade de prescrições médicas antes e depois apresentações […] Se o palestrante não causasse o impacto que a empresa buscava, ele não seria convidado novamente.”

Sabemos que existem pagamentos para médicos nos EUA
A mais clara evidência que há sobre os efeitos do financiamento da indústria farmacêutica na prescrição vem de um programa administrado pelo governo dos EUA chamado Open Payments [17].

Desde 2013, cada empresa de medicamentos e dispositivos deve declarar qualquer pagamento de acima de $10 em qualquer ano. Os relatórios de pagamento são ligados a produtos promovidos, o que permite aos pesquisadores comparar os pagamentos a médicos com seus hábitos de prescrição.

A análise desses dados, que envolve centenas de milhares de médicos, demonstrou sem nenhuma dúvida que os pagamentos promocionais afetam a prescrição [18].

A pesquisa dos EUA também mostra que os médicos que estudaram em faculdades de medicina que proibiram que alunos recebessem pagamentos e presentes de empresas farmacêuticas eram menos propensos a prescrever medicamentos mais novos e mais caros que apresentassem evidências limitadas de benefícios quando comparados a medicamentos existentes [19].

No geral, as faculdades de medicina australianas possuem restrições fracas ou inexistentes quando se trata de permitir que estudantes de medicina tenham contato com representantes de vendas de produtos farmacêuticos [20], receberem presentes ou participarem de eventos patrocinados pela indústria durante seu treinamento clínico. Elas tão pouco possuem restrições quanto a permitir que integrantes do pessoal acadêmico se engajem em consultorias com fabricantes cujos produtos são apresentados em suas aulas.

Portanto, um primeiro passo para evitar a influência indevida da indústria farmacêutica nas decisões de prescrição é proteger estudantes de medicina dessa influência por meio de políticas mais rígidas que combatam o conflito de interesses, como as mencionadas acima.

A segunda se trata de melhorar a orientação dada a médicos individuais por parte de organizações profissionais e órgãos reguladores sobre os tipos de financiamento que são ou não são aceitáveis. Acreditamos que nenhum médico ativamente envolvido no atendimento ao paciente deve aceitar pagamentos de uma empresa farmacêutica para palestras, viagens internacionais ou consultorias.

Em terceiro lugar, se a Medicines Australia se diz levar a sério a transparência, ela deve exigir que as empresas declarem todos os seus pagamentos – inclusive de alimentos e bebidas – e que incluam os nomes dos profissionais de saúde junto dos seus números de registro na Ahpra. Isso é parecido com a norma de relatório adotada por empresas farmacêuticas nos EUA e permitiria uma perspectiva mais completa e clara do que está acontecendo na Austrália.

Os pacientes confiam em médicos para escolherem os melhores tratamentos disponíveis para atender às suas necessidades de saúde com base em evidências científicas de segurança e eficácia. Eles não contam com a influência do marketing nessa escolha.

Referências

  1. Forbes, M., Bhowon, Y., & Mintzes, B. Pharmaceutical company payments to Australian doctors reported to Medicines Australia, 2019–22: a cross‐sectional analysis. The Medical Journal of Australia. May 6, 2024; 220(8), 425–427. https://doi.org/10.5694/mja2.52284
  2. Fabbri, A., Grundy, Q., Mintzes, B., et al. A cross-sectional analysis of pharmaceutical industry-funded events for health professionals in Australia. BMJ Open. June 30, 2017; 7(6), e016701. https://doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016701
  3. Disclosure Australia. Medicines Australia. (n.d.). https://www.disclosureaustralia.com.au/
  4. Regulating Australia’s health practitioners. Ahpra & National Boards. (n. d.). https://www.ahpra.gov.au/
  5. Top 10 drugs 2022–23. Australian Prescriber. December 12, 2023; 46(4), 93. https://doi.org/10.18773/austprescr.2023.030
  6. Cherla, A., Renwick, M., Jha, A. Cost-effectiveness of cancer drugs: Comparative analysis of the United States and England. The Lancet. November 5, 2020. https://doi.org/10.1016/j.eclinm.2020.100625
  7. Mitchell, A. P., Dusetzina, S. B., Meza, A. M., et al. Pharmaceutical industry payments and delivery of non-recommended and low value cancer drugs: population based cohort study. BMJ. October 25, 2023. e075512. https://doi.org/10.1136/bmj-2023-075512
  8. Fickweiler, F., Fickweiler, W., & Urbach, E. Interactions between physicians and the pharmaceutical industry generally and sales representatives specifically and their association with physicians’ attitudes and prescribing habits: a systematic review. BMJ Open. 2017; 7(9), e016408. https://doi.org/10.1136/bmjopen-2017-016408
  9. Agha, L., & Zeltzer, D. Drug Diffusion through Peer Networks: The Influence of Industry Payments. American Economic Journal Economic Policy. May 2022; 14(2), 1–33. https://doi.org/10.1257/pol.20200044
  10. DeJong, C., Aguilar, T., Tseng, C. Pharmaceutical Industry-Sponsored Meals and Physician Prescribing Patterns for Medicare Beneficiaries. JAMA Internal Medicine. August 2016. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27322350/
  11. Hadland, S. E., Cerdá, M., Li, Y., Krieger, M. S., et al. Association of Pharmaceutical Industry Marketing of opioid products to physicians with subsequent opioid prescribing. JAMA Internal Medicine. June 2018; 178(6), 861. https://doi.org/10.1001/jamainternmed.2018.1999
  12. Opioid crisis: addiction, overprescription, and insufficient primary prevention. The Lancet. July 2023. https://doi.org/10.1016/j.lana.2023.100557
  13. Marks, J. H. Opioid crisis shows partnering with industry can be bad for public health. The Conversation. March 6, 2019. https://theconversation.com/opioid-crisis-shows-partnering-with-industry-can-be-bad-for-public-health-112649
  14. Mitchell, A. P., Trivedi, N. U., Gennarelli, R. L., et al. Are financial payments from the pharmaceutical industry associated with physician prescribing? Annals of Internal Medicine. Mar, 2021; 174(3), 353–361. https://doi.org/10.7326/m20-5665
  15. Hartung, D. M., Johnston, K., Cohen, D. M., et al. Industry payments to physician specialists who prescribe repository corticotropin. JAMA Network Open. June, 2018; 1(2), e180482. https://doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2018.0482
  16. Moynihan, R. Key opinion leaders: independent experts or drug representatives in disguise? BMJ. June 21, 2008; 336(7658), 1402–1403. https://doi.org/10.1136/bmj.39575.675787.651
  17. Home | Open Payments Data – CMS. (n.d.). https://openpaymentsdata.cms.gov/
  18. Mitchell, A. P., Trivedi, N. U., Gennarelli, R. L., et al. Are financial payments from the pharmaceutical industry associated with physician prescribing? Annals of Internal Medicine. Mar, 2021; 174(3), 353–361. https://doi.org/10.7326/m20-5665
  19. King, M., Essick, C., Bearman, P., & Ross, J. S. Medical school gift restriction policies and physician prescribing of newly marketed psychotropic medications: difference-in-differences analysis. BMJ. January 31, 2013; 346(jan30 5), f264. https://doi.org/10.1136/bmj.f264
  20. Hooimeyer, A., Lines, T., Mirzaei, J., et al. Conflict of interest policies at Australian medical schools. Internal Medicine Journal. June 27, 2023; 54(1), 62–73. https://doi.org/10.1111/imj.16148
creado el 15 de Enero de 2025