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A explicação do efeito placebo

(La explicación del efecto placebo)
Javier Sampedro
El País, 27 de julho de 2024
https://elpais.com/opinion/2024-07-27/la-explicacion-del-efecto-placebo.html
Traduzido por Salud y Fármacos, publicado em Boletim Fármacos: Ensaios Clínicos 2024; 2 (4)

A mente quer deixar de sentir dor, e esse simples fato permite que ela convença o corpo a não senti-la.

Sobre o efeito placebo, já se disseram tantas simplificações ilusórias que muita gente o considera um tema para programas como Quarto Milênio, A Bruxa Lola ou algo nessa linha. Mas o efeito placebo existe e foi comprovado em dezenas de ensaios clínicos sobre novos analgésicos. São ensaios duplo-cego, onde nem os pacientes nem os médicos sabem quem está tomando o medicamento e quem está recebendo uma pílula de farinha ou qualquer outra substância irrelevante (o placebo). Quando os resultados são revelados, vê-se que uma proporção significativa dos pacientes que sentiram alívio tomaram farinha. Isso é um fato e exige uma explicação científica.

Os especialistas consideram o efeito placebo um exemplo destacado de interação entre mente e corpo. É uma nomenclatura um tanto pomposa, visto que a mente é uma parte do corpo, mas não nos percamos pelos becos sem saída da lexicografia. A ideia é que a mente quer deixar de sentir dor, e esse simples fato permite que ela convença o corpo a não senti-la. A mera expectativa de que algo vai aliviar a dor já é suficiente para amenizá-la, mesmo que isso signifique ingerir uma pílula de farinha ou receber uma injeção de soro fisiológico para simular um tratamento.

Isso funciona apenas em algumas pessoas, claro, mas funciona realmente para elas. A questão é relevante para a prática médica e, sem dúvida, para os ensaios clínicos que buscam determinar se um novo analgésico é eficaz. O efeito placebo deve ser descontado tanto no grupo de controle quanto entre aqueles que receberam o medicamento real, onde parte dos efeitos também pode ser atribuída ao mesmo fenômeno. É uma questão difícil, mas abordável experimentalmente.

Os defensores de explicações místicas vão se decepcionar ao saber que camundongos também experimentam o efeito placebo. Se aliviar a dor com o poder da alma é viável, então os camundongos têm alma. Se em vez de chamar de alma você o chama de força de vontade, terá que conceder esse superpoder aos nossos primos roedores. A questão é que a dor é uma constante no mundo animal, e o efeito placebo parece ser também. Isso pode humilhar a grandeza humana, mas tem a grande vantagem de que podemos estudar as bases neurais do efeito placebo nos camundongos, e — acredite — esse é o segredo para avançar rapidamente na neurologia. Foi o que fizeram Grégory Scherrer e seus colegas das universidades da Carolina do Norte, Harvard, Howard Hughes, Columbia, Stanford e do Instituto Allen. “Nenhum homem é uma ilha”, como disse John Donne. Ninguém é uma ilha na neurociência atual.

A causa última do efeito placebo não está na alma nem no hiperespacial, mas sim no córtex cingulado anterior (CCA), localizado atrás da testa e entre as têmporas. Um século de neurologia nos diz que ele se conecta, de um lado, com as emoções e, de outro, com a razão, e, dessa forma, está envolvido na atenção seletiva, na tomada de decisões e — de forma crucial para o que nos interessa aqui — na antecipação de uma recompensa. Se temos algo parecido com o livre-arbítrio, o que alguns neurocientistas questionam, o CCA (córtex cingulado anterior) é um forte candidato a hospedá-lo de algum modo.

Scherrer e seus colegas conseguiram observar com grande precisão que, durante o efeito placebo, a atividade do CCA se projeta sobre os núcleos pontinos, uma porta de entrada para o cerebelo, que até agora parecia estar apenas envolvida no controle dos movimentos, e daí para o cerebelo em si. Acontece que nesse circuito neuronal há uma abundância de receptores opióides, o que explica quase tudo. Vivemos pelo mundo “drogados” e não percebemos.

creado el 9 de Enero de 2025