Objetivo. O ensaio FOURIER mostrou o benefício do inibidor da PCSK9 evolocumab frente ao placebo nos resultados cardiovasculares em pacientes com doenças cardiovasculares. No entanto, notamos algumas inconsistências entre a Informação do Relatório de Estudo Clínico (REC) e a publicação dos resultados primários do estudo, em 2017. Nosso objetivo era restaurar os dados de mortalidade do estudo FOURIER usando informações das narrativas sobre as mortes mencionadas no REC.
Métodos. Os dados de mortalidade da publicação dos resultados primários foram comparados com os do REC. Quando houve discrepância entre as fontes, um comitê independente realizou uma leitura cega e estabeleceu a causa da morte com base nas informações contidas nas narrativas do REC.
Resultados. Em 360/870 mortes (41,4%), a causa da morte julgada pelo comitê de eventos clínicos FOURIER diferia daquela declarada pelo investigador clínico local. Comparando as informações do REC com a publicação dos resultados primários, de 2017, encontramos 11 mortes a mais por infarto do miocárdio no grupo evolocumab (36 frente a 25) e 3 mortes a menos no grupo placebo (27 frente a 30, respectivamente).
No REC, o número de mortes por insuficiência cardíaca no grupo evolocumab foi quase o dobro do grupo placebo (31 versus 16).
Embora a analise original do ensaio não separou a avaliação de mortes cardíacas das mortes vasculares, após a reintegração, descobrimos que as mortes cardíacas foram numericamente, mas não significativamente, maiores no grupo que recebeu evolocumab (113) do que no grupo placebo (88; risco relativo [RR] 1,28; IC 95%: 0,97 a 1,69; p = 0,078), enquanto as mortes vasculares não cardíacas foram semelhantes em ambos os grupos (37 em cada um; RR 1,00, IC 95%: 0,63 a 1,58, p = 0,999).
O coeficiente de risco notificado para a mortalidade cardiovascular, na análise do estudo original, foi de 1,05 (IC 95%: 0,88 a 1,25). Após a reintegração, foi observado um aumento relativo maior (embora não significativo) da mortalidade cardiovascular no grupo tratado com evolocumab (RR 1,20, IC 95% 0,95 a 1,51, p = 0,13).
Conclusão. Após a reintegração no estudo FOURIER, as mortes de origem cardíaca foram numericamente maiores no grupo tratado com evolocumab do que no grupo placebo, sugerindo um possível dano cardíaco. O estudo foi concluído antes do tempo estabelecido e, naquele momento, foi observado um maior risco, não significativo, de mortalidade cardiovascular com o evolocumab e que foi numericamente maior em nossa reintegração.
É necessário fazer um reestabelecimento completo dos dados do ensaio FOURIER. Enquanto isso, os clínicos devem ser céticos ao prescrever evolocumab para pacientes com doença cardiovascular aterosclerótica estabelecida.