Em 2022, uma equipe francesa publicou uma análise dos efeitos adversos cardíacos dos medicamentos antivirais de ação direta usados para tratar hepatite C. O estudo baseou-se em uma coorte francesa de adultos com hepatite C crônica que foram acompanhados em 32 departamentos hepatológicos hospitalares e em dados cardiovasculares do sistema nacional de dados de saúde francês (SNDS), que inclui dados de seguros de saúde e de internações [1].
8.148 pacientes foram inscritos, entre 2012 e 2015: 7.037 haviam iniciado o tratamento com antivirais de ação direta e 1.111 não haviam recebido tratamento algum. Suas principais características de linha de base eram semelhantes, exceto pelo fato de que uma proporção maior de pacientes apresentava fibrose hepática avançada no grupo que recebeu tratamento antiviral. A análise abrangeu 22.326 pacientes-ano de exposição a antivirais de ação direta e 12.905 pacientes-ano sem exposição. A da mediana duração do acompanhamento foi de aproximadamente 4,5 anos.
Em geral, o tratamento com antivirais de ação direta parece estar associado a uma maior incidência de eventos cardiovasculares, uma diferença que foi estatisticamente significativa para arritmias ou transtornos de condução cardíaca. Para 10.000 pacientes acompanhados por um ano, cerca de 65 desses distúrbios ocorreram naqueles expostos a antivirais de ação direta, em comparação com 40 na ausência de exposição. Nesse estudo, a razão de risco ajustada (aHR) em comparação com a ausência de exposição a antivirais foi de aproximadamente 1,5, com um intervalo de confiança de 95% (95CI) de 1.0 a 2.0. Os transtornos pareciam ser sustentados, inclusive após a suspensão do tratamento, com pouquíssima alteração na aHR após 1, 2 ou 3 anos de acompanhamento.
O risco de arritmias ou de transtornos de condução cardíaca foi observado principalmente com combinações de antivirais de ação direta contendo sofosbuvir (comercializado isoladamente como Sovaldi° e em combinação com outros antivirais como Epclusa°, Harvoni° e Vosevi°). Em 65% dos casos, os transtornos consistiram em fibrilação ou flutter atrial, ou bloqueio atrioventricular total.
Em 2015, foram relatados casos de bradicardia grave e transtornos de condução cardíaca com tratamento contendo sofosbuvir, que ameaçavam à vida, inicialmente no contexto de uma interação medicamentosa com amiodarona (Cordarone°). Depois, em 2016, foram publicados relatos detalhados de bradicardia que resultaram na colocação de marca-passo, mesmo sem uma interação medicamentosa com a amiodarona [2,3].
NA PRÁTICA Pacientes expostos a antivirais de ação direta como tratamento para a hepatite C devem ter monitoramento clínico e eletrocardiográfico regular, inclusive após a suspensão do tratamento, especialmente se a combinação de medicamentos incluir o sofosbuvir ou se outros fatores de risco estiverem presentes, em particular o uso de amiodarona ou outros medicamentos que diminuem a frequência cardíaca ou apresentam risco de arritmia ou de transtornos de condução.
Referências