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Ensaios Clínicos e Ética

O estudo clínico do simufilam da Cassava Sciences deve ser interrompido

Salud y Fármacos
Boletim Fármacos: Ensaios Clínicos 2024; 2(2)

Tags: simufilam, estudos clínicos de Alzheimer, Cassava, participação em estudos clínicos sem ter todas as informações, má conduta na condução de estudos clínicos, fraude científica, incentivos inadequados para executivos, comportamento antiético na implementação de estudos clínicos, Remoxy, Pain Therapeutics

Segundo Statnews [1] relatou no artigo que resumimos, há sérias dúvidas sobre a base científica para usar simufilam no tratamento do Alzheimer, como está sendo feito em pesquisas pela City University of New York (CUNY). Consequentemente, dado que a FDA deve proteger a segurança dos pacientes, o correto eticamente seria parar os dois ensaios clínicos de Fase III que estão sendo realizados com esse produto.

A FDA tem autoridade para suspender ensaios clínicos com medicamentos experimentais quando há evidência de que podem representar um risco inaceitável para a segurança dos participantes do estudo. O simufilam não parece ser tóxico, nem causar efeitos colaterais perigosos. No entanto, os participantes também podem ser prejudicados quando aceitam participar de um ensaio depois de receberem informações falsas ou enganosas sobre a eficácia potencial de um medicamento.

O comitê da CUNY que investiga o principal colaborador científico da Cassava, o neurocientista Hoau-Yan Wang, não conseguiu provar definitivamente que Wang falsificou informações sobre o simufilam, porque ele se recusou a entregar os dados originais e os registros primários da pesquisa que o comitê queria analisar. Wang também afirmou que caixas de registros relacionados à pesquisa foram jogadas fora.

O comitê determinou que o fato de Wang não preservar ou manter adequadamente os registros da pesquisa era “muito sugestivo de má conduta científica deliberada” para quase metade das acusações feitas contra ele, incluindo aquelas relativas ao suposto mecanismo de ação do simufilam. “Portanto, a integridade do trabalho do Dr. Wang continua sendo muito questionável”, conclui o relatório.

O relatório também implica Lindsay Burns, vice-presidente sênior de neurociência da Cassava, que trabalhou de perto com Wang no simufilam, e que é casada com o CEO da Cassava, Remi Barbier.

A empresa continua defendendo o simufilam, seu principal candidato a medicamento.

Os dois ensaios com simufilam estão recrutando, no total, um pouco mais de 1.900 pessoas com doença de Alzheimer, e as designando aleatoriamente para tratamento com simufilam ou um placebo.

Após parar o estudo, a FDA deveria realizar uma investigação independente das informações coletadas e fazer uma análise de futilidade. Se a análise preliminar dos dados não fosse conclusiva, a FDA poderia suspender a paralisação dos ensaios clínicos, cujos resultados finais deveriam estar disponíveis no final de 2024.

Em maio de 2020, a Cassava comunicou os resultados preliminares de um ensaio clínico no qual, comparado com o placebo, o simufilam não conseguiu reduzir os níveis da proteína tau e outros biomarcadores detectados no líquido cefalorraquidiano de pacientes com Alzheimer. Mas, em vez de aceitar o resultado, Barbier disse que a análise dos dados estava errada. A empresa contratou um centro acadêmico (o laboratório de Wang) para fazer outra análise, e desta vez os resultados foram positivos para o simufilam, pois mostrava reduções significativas da proteína tau e outros biomarcadores da doença de Alzheimer em comparação com o placebo.

Segundo Statnews, tudo gira em torno do dinheiro. O projeto não tem nada a ver com ajudar os doentes de Alzheimer, mas sim com o desejo de Barbier e dos executivos que trabalham para ele, de enriquecerem às custas dos investidores e, pior, das pessoas que sofrem de Alzheimer.

Antes da Cassava revelar dados clínicos sobre o simufilam, a empresa criou um “plano de incentivos em dinheiro”, projetado para pagar milhões de dólares a Barbier e outros executivos baseando-se unicamente no aumento da capitalização de mercado da empresa. Esse tipo de plano incentiva as empresas a aumentar o preço de suas ações, em vez de se concentrar em desenvolver um medicamento eficaz e garantir sua aprovação.

Barbier não goza de uma boa reputação. Nos anos 2000, a Cassava se chamava Pain Therapeutics e estava tentando desenvolver um opioide resistente ao abuso, o Remoxy, que a FDA reprovou quatro vezes entre 2008 e 2018. O preço das ações da Pain Therapeutics perdeu 98% de seu valor durante esses 10 anos, mas Barbier, como CEO, ganhou quase US$ 27 milhões em salários, gratificações e concessões de opções de ações, de acordo com os registros da SEC (Securites and Exchange Commission ou a Bolsa de Valores).

Esse deveria ter sido o fim da Pain Therapeutics e da carreira biotecnológica de Barbier. Ao invés disso, Barbier foi atrás de um fármaco obscuro para tratar Alzheimer que estava inativo no laboratório da empresa há anos. A Pain Therapeutics tornou-se a Cassava Sciences e o simufilam substituiu o Remoxy.

Ignorado pelas instituições que investem na saúde, Barbier cultivou laços estreitos com investidores pequenos, que acreditaram na história absurda de que o simufilam era uma cura mágica para o Alzheimer. O valor de mercado da Cassava ultrapassou US$ 5 bilhões por um breve período. Entretanto, promover as ações na ausência de um produto promissor não é sustentável. Desde o pico em meados de 2021, o preço das ações da Cassava caiu 90%. O valor de mercado da empresa hoje é de apenas US$ 500 milhões, o que ainda é muito alto porque o simufilam não funciona e eles não têm nenhum outro produto em desenvolvimento que seja promissor.

Fonte Original

  1. Adam Feuerstein. It’s time for the FDA to halt Cassava Sciences’ Alzheimer’s clinical trials. Statnews, 17 de octubre de 2023. https://www.statnews.com/2023/10/17/its-time-for-the-fda-to-halt-cassava-sciences-alzheimers-clinical-trials/
creado el 11 de Noviembre de 2024